Conferência, que terminou na última sexta na Polônia, tentou eliminar ideia de conflito entre desenvolvimento e meio ambiente
O relatório Global Warming of 1,5°C estima que as atividades humanas fizeram a temperatura média global subir cerca de 1°C acima dos níveis pré-industriais em 2017 - Foto: MichaEli/CCommons
Por Marília Carrera e Luchelle Furtado, de Karowice
Um dia depois do término oficial da 24ª Conferência do Clima (COP 24), em Katowice, na Polônia, um grupo formado por 197 nações estabeleceu as diretrizes para a implantação da agenda do Acordo de Paris, que entrou em vigor dois anos atrás. O chamado “Katowice Climate Package” indica como os países informarão sobre o cumprimento dos seus compromissos, as chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês).
De acordo com informe oficial, o plano coloca também novas diretrizes para o balanço das ações climáticas em 2023, para avaliação do progresso e transferência de tecnologias, e para mecanismos de financiamento para apoiar países em desenvolvimento, a serem cumpridas até 2025. A meta atual é de US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020.
“As Partes reconhecem que algumas Partes optam por buscar a cooperação voluntária na implementação de suas contribuições nacionalmente determinadas para permitir uma maior ambição em suas ações de mitigação e adaptação e promover o desenvolvimento sustentável e a integridade ambiental”, diz o documento oficial.
Entretanto, ficaram pendentes, por exemplo, temas como mecanismos de desenvolvimento sustentável e abordagens cooperativas, que permitem aos países atingirem metas de redução de emissões utilizando instrumentos financeiros. A solução de divergências relacionadas ao Acordo de Paris foi adiada para a próxima Conferência (COP 25), em 2019, no Chile.
A COP 24 foi marcada por incertezas em relação ao Acordo de Paris, assinado por 195 países. Desde sua assinatura, houve acontecimentos de peso, como o anúncio da saída dos Estados e a recusa dos próprios americanos, além da Arábia Saudita e da Rússia, de aceitarem conclusões de relatórios científicos que falam dos riscos relacionados ao aquecimento do planeta.
Com a eleição do novo governo, o posicionamento do Brasil também passou a ser visto como incerto. Na semana passada, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, voltou a dizer, em uma transmissão em vídeo, que vai propor mudanças e a colocar em dúvida a permanência do Brasil no Acordo do Clima. O Brasil chegou a se candidatar para ser sede da COP 25, mas abriu mão.
“A convenção retornaria para o lugar de onde veio, o que poderia ser uma oportunidade para o país mostrar sua liderança”, comentou, o secretário-executivo do Observatório do Clima, Carlos Rittl, durante um dos eventos paralelos às sessões da COP 24.
Sobre a relação entre meio ambiente e agricultura, Rittl destacou a importância de se investir em práticas mais sustentáveis. “Temos muito a ganhar com investimento em agricultura sustentável. Temos muito potencial para investir em energia renovável”, afirmou.
Relatório
A COP foi realizada na esteira da divulgação do relatório Global Warming of 1,5°C (Aquecimento Global de 1.5°C), que estima que as atividades humanas fizeram a temperatura média global subir cerca de 1°C acima dos níveis pré–industriais em 2017. O IPCC alerta que aspectos como crescimento econômico, fornecimento de água e segurança alimentar podem ser afetados por um aquecimento de 1,5°C a 2°C.
A vice–presidente do IPCC, Thelma Krug, destaca a importância dos países signatários do Acordo de Paris aliarem o desenvolvimento sustentável ao cumprimento das metas. “Há diferentes formas para limitar o aumento da temperatura até o final do século. É interessante que os países se adaptem às medidas para mitigar as mudanças climáticas justamente sem aprofundar as desigualdades sociais”, diz.
Ela ressalta a necessidade da mobilização antes da aplicação em 2020 e do balanço inicial previsto para 2023 do Acordo de Paris. “Um dos objetivos do relatório foi levar a mensagem sobre as consequências que seriam evitadas se o aumento da temperatura se limitasse a 1,5°C. O custo de um aquecimento de 2°C serão muito maiores, com implicações muito sérias na biodiversidade, na economia e na saúde”, afirma.
Amazônia
O levantamento do IPCC também indica que a remoção de dióxido de carbono poderia ser utilizada para compensar ou até resultar em emissões negativas de gás carbônico na atmosfera. Entre as medidas para a remoção de dióxido de carbono estão o florestamento e o reflorestamento e a restauração e o sequestro de carbono do solo.
As áreas Preservação Permanente (APP), Reserva Legal e Uso Restrito na Amazônia são um importante instrumento para o estoque de carbono no Brasil. De acordo com o coordenador de políticas públicas do Greenpeace Brasil, Márcio Astrini, a manutenção da Amazônia é imprescindível para a prestação de serviços ambientais no Brasil e na América Latina.
“Grande parte das chuvas que chegam no continente sul americano inteiro, dependem da existência da Amazônia. Essas chuvas, são as mesmas que alimentam as represas e que fornecem água para as nossas casas. Também são as mesmas que irrigam as plantações de alimento no Brasil, produção que é grande responsável do PIB nacional”, diz.
Para Astrini, florestas oferecem enorme potencial econômico. Principalmente a Amazônia, por ser o principal bioma do Brasil. “A Amazônia é uma farmácia a céu aberto, com curas para doenças humanas e não humanas que ainda não existem. Também é a maior concentração de vida da Terra, com frutos e outros produtos que podem ser aproveitados do ponto de vista econômico sem a necessidade de desmatar”.
Segundo o coordenador de políticas públicas do Greenpeace Brasil, o desmatamento é impulsionado pela falta de governança e pela grilagem de terra no Brasil. “O desmatamento traz prejuízo em vez de progresso, seja prejuízo à economia ou prejuízo à imagem do país. Não há nenhuma vantagem em desmatar”, diz ele.
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